“Cidadãos desmotivados politicamente impedem avanço de cidades inteligentes”

Presidente do Instituto Campus Party, Francesco Farruggia preocupa-se em como as novas tecnologias podem auxiliar no desenho das políticas públicas nas cidades contemporâneas. No Brasil, ajudou a formar a Rede Brasileira de Cidades Inteligentes e Humanas. Entre 9 e 13 de agosto, o Instituto Campus Party promoverá também o Fórum Universidades Empreendedoras na versão soteropolitana do evento de tecnologia. A Campus Party de Brasília, ocorrido entre 14 e 18 de junho, recebeu 70 mil participantes.
Em entrevista à CartaCapital, Farruggia dá exemplos de municípios que utilizam essas novas tecnologias e dos ganhos que essas cidades podem ter.
CartaCapital: Como surgiu o Fórum de Cidades Inteligentes da Campus Party?
Francesco Farruggia: Há quatro anos participei do Summit da Comunidade Europeia, em Veneza. Estavam presentes presidentes, ministros de ciência e tecnologia, a indústria, operadoras de celulares, de telefone, o Google, etc. O objetivo foi discutir a agenda digital da comunidade europeia dos próximos 10 anos.
Entre os tópicos debatidos, constavam as prioridades, onde seriam alocados recursos financeiros, quais seriam os próximos passos para a regulamentação. Depois de cinco dias de discussão, os participantes chegaram a diversas conclusões.
Particularmente, achei que a mais importante foi a definição de que todos os esforços deveriam se concentrar nas cidades.
CC: E por que nas cidades?
FF: Porque você pode ter amigos virtuais em Nova York ou Tóquio, mas a sua vida se desenvolve nas cidades. Você se movimenta nela, produz lixo, fica doente, trabalha, ou seja, toda a sua vida gira em torno das cidades.
Outra discussão que me chamou a atenção foi a falta de credibilidade por parte dos cidadãos na política e nos políticos, que, por sua vez, entendiam que prover serviços inteligentes e humanos aos cidadãos poderia retomar a participação destes na vida pública.
Uma terceira discussão interessante foi a de que a revolução digital teria potencial para empregar jovens com menos de trinta anos na Europa. Nesse sentido, o favorecimento ao desenvolvimento de startups e de empresas de tecnologia e a oferta de produtos e serviços para o setor público pode contribuir para resolver esse problema.
Depois que voltei do evento, pensei em como a Campus Party poderia ajudar o Brasil a entrar nessa discussão.
CC: Como?
FF: Elaboramos, então, duas grandes inciativas: a primeira foi a Rede Brasileira de Cidades Inteligentes e Humanas. Criada em 2013, no âmbito da Frente Nacional de Prefeitos – que congrega as 350 maiores cidades brasileiras -, reúne secretários e dirigentes municipais de ciência, tecnologia e inovação, bem como secretários municipais de desenvolvimento econômico.
É presidida por André Gomide, cuja a missão é integrar e extrair para a pauta o assunto e os problemas de uma cidade inteligente. A segunda ação foi promover a construção de uma Frente Parlamentar Bicameral e Multipartidária dentro do Congresso Nacional para tratar dos temas das cidades inteligentes.
CC:E por quê?
FF: Porque a revolução digital vai provocar mudanças. Normalmente, o poder executivo está envolvido em resolver somente a contingência. Nós já estamos pensando de forma mais ampla: quais problemas no Brasil e no mundo pedem uma agenda constante, conspícua e forte sobre cidades inteligentes?
O poder público não tem tempo de cuidar de todos os assuntos que nós podemos dar mais atenção por meio da Rede Brasileira de Cidades Inteligentes e Humanas.
O segundo motivo pelo qual é difícil colocar na pauta – e isso é igual em todo o mundo e não só no Brasil – é que você tem que ter a participação do cidadão obrigatoriamente para conseguir avançar. Se você tem cidadãos desinformados e desmotivados para a vida pública, você nunca vai construir rapidamente cidades inteligentes e humanas.
CC: Quais são as principais implicações da aplicação das novas tecnologias da comunicação e da informação na gestão das cidades e de suas políticas públicas?
FF: Tenho que começar respondendo que uma Frente Parlamentar foi criada para resolver isso. Mas a principal implicação é fazer acontecer. E qual seria a solução? De uma parte, criar laboratórios de robótica nas escolas públicas, como as Fab labs que foram criadas em São Paulo. O [ex-prefeito] Fernando Haddad (PT-SP) criou doze Fab labs nas favelas de São Paulo para atrair crianças para que assim possam desenvolver as suas ideias.
Há um programa de aceleração que é o melhor hoje no Brasil e que se chama SEED (Startups and Entrepreneurship Ecosystem Development). Pertence ao governo do estado de Minas Gerais. É um magnífico programa de aceleração, onde elaboram programas de startups.
No programa, é criado todo um ambiente para que jovens possam ter uma empresa, com todo o assessoramento fiscal, legal, com realização de business plan e para que tenham condições de operar. Depois eles aproximam essas startups ou com o poder público ou com empresas que possam ter interesse em desenvolver um projeto.